O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) pronunciou-se, em final de 2023, no acórdão C-472/22, sobre a compatibilidade do regime fiscal português, em especial do artigo 43.º n.º3 do Código do IRS, com os princípios da liberdade de estabelecimento e da livre circulação de capitais, previstos, designadamente, no artigo 63.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia.Nos termos daquele artigo, as mais-valias provenientes de transmissões de participações sociais em micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores apenas são consideradas em 50% do seu valor.No caso sub judice, um nacional francês, com residência fiscal em Portugal, alienou as participações sociais que detinha numa sociedade francesa, com sede em França, considerada uma «pequena empresa» para efeitos do artigo 2.° do anexo ao Decreto‑Lei n.° 372/2007, rendimento este que acabou por ser considerado na íntegra, sem o benefício dos 50%. Segundo a Autoridade Tributária, este benefício fiscal visa apoiar as empresas portuguesas e estimular a atividade económica em Portugal, pelo que apenas se aplicaria a transmissões de ações de empresas sediadas em Portugal.Ora, o TJUE concluiu que tal disposição era contrária ao Direito da União, por constituir uma restrição injustificada à liberdade de estabelecimento e à livre circulação de capitais, na medida em que estaria a favorecer os investimentos em empresas nacionais, em detrimento das restantes empresas europeias.A nosso ver, admitir que os contribuintes que investiram em empresas que exercem uma atividade económica em Portugal seriam colocados numa situação diferente dos contribuintes que investiram em empresas que exercem uma atividade económica fora de Portugal, quando o artigo 63.º, n.º 1, TFUE proíbe precisamente as restrições aos movimentos de capitais transfronteiriços, esvaziaria esta disposição do seu conteúdo. Aliás, tendo em conta a letra dos nºs 3 e 4 do art.º 43º do CIRS, sempre se refira que não resulta que tal regime seja aplicável unicamente às mais valias geradas por micro e pequenas empresas com sede ou direção efetiva em território nacional. Assim, uma interpretação dos mesmos normativos nesse sentido seria contrária aos elementos racional e teleológico da interpretação, por conduzirem a uma solução contrária ao imperativo de assegurar o princípio comunitário da liberdade de circulação de capitais, o que não deverá ser tido por pretendido por um legislador razoável.Esta decisão abre a possibilidade a todos os contribuintes que tenham obtido rendimentos provenientes da transmissão de participações sociais de empresas sediadas no estrangeiro e que foram tributados na íntegra, contestar a respetiva liquidação de IRS, invocando o benefício previsto no artigo 43.º n.º3 do CIRS.