Advogados explicam como se devem processar as visitas a imóveis arrendados e como evitar casos de assédio no arrendamento.
Os inquilinos estão obrigados a aceitar as visitas agendadas pelos senhorios aos imóveis que têm arrendados? Seja para vistorias ou para mostrar a casa a potenciais compradores/arrendatários? E no atual contexto de pandemia como se gerem estes processos? Respondemos a estas e outras dúvidas, com base no que diz a lei.
O arrendamento é uma figura jurídica que comporta em si diversas vantagens para ambas as partes contratuais, sendo que, para o arrendatário, tem as vantagens evidentes de não ter que suportar diversos encargos financeiros associados à propriedade, concretamente a aquisição, pagamentos de seguros, impostos, …
Assim, pode mediante uma retribuição e temporariamente, gozar de um imóvel que não lhe pertence. Tal como explica a CRS Advogados neste artigo preparado para o idealista/news, proporcionar o gozo do imóvel pelo arrendatário é precisamente a principal obrigação do senhorio e isto tem como consequência inerente o dever do senhorio, não dispor do imóvel arrendado como se essa relação não existisse, apesar de ser o proprietário.
Assédio no arrendamento proibído por lei
Esta imposição legal foi ainda recentemente vincada pelo legislador, aquando da alteração ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) promovida pela Lei 12/2019, de 12 de fevereiro, que veio instituir uma “nova” obrigação para o senhorio, a proibição do assédio no arrendamento, entendendo-se como assédio, nos termos legais, “qualquer comportamento ilegítimo do senhorio, de quem o representa ou de terceiro interessado na aquisição ou na comercialização do locado, que, com o objetivo de provocar a desocupação do mesmo, perturbe, constranja ou afete a dignidade do arrendatário, subarrendatário ou das pessoas que com estes residam legitimamente no locado, os sujeite a ambiente intimidativo, hostil, degradante, perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo, ou impeça ou prejudique gravemente o acesso e a fruição do locado”.
Portanto, o legislador veio reforçar aquela obrigação do senhorio, não deixando dúvidas sobre o comportamento a que este está adstrito por força do contrato de arrendamento ou subarrendamento. Note-se que, também com aquela lei, introduziu-se um mecanismo legal de interpelação do senhorio pelo arrendatário para que cesse o comportamento contrário e, mantendo-se o incumprimento, a possibilidade de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, como forma de penalizar o senhorio.
Senhorio impedido de incomodar a vida do inquilino, mas há exceções
Aqui chegados, começa-se a perceber que o senhorio não pode incomodar o arrendatário, não pode limitar o gozo do imóvel por este, ou seja, não pode intrometer-se no que é a vida do arrendatário no locado.
Mas isto também não significa que tenha que entregar o imóvel ao arrendatário no início do contrato e apenas possa lá voltar a entrar findo o arrendamento. Isto porque, é-lhe permitido o exame do locado, sendo que, a utilização deste termo não deixa muitas dúvidas sobre o alcance da norma, visando possibilitar ao senhorio confirmar o estado em que se encontra o locado, e não atribuir um direito para se deslocar ao imóvel e visitá-lo sempre que lhe aprouver. De outra forma, estaria a violar o direito de gozo do arrendatário. Assim, diremos que este direito de o senhorio examinar o locado deve ser realizado esporadicamente, de forma a confirmar o bom uso do locado pelo arrendatário, ou perante alguma circunstância anormal que motive a necessidade de ir ao locado.
Na senda do que se vem aqui escrevendo, conclui-se que o senhorio não pode exigir que o arrendatário, que está a cumprir escrupulosamente o contrato e que como contrapartida do pagamento de uma renda tem o gozo do locado, seja obrigado a aceitar as visitas de potenciais compradores do locado, na hipótese do senhorio pretender vender na manutenção do arrendamento, ou findo o arrendamento, mas não queira esperar que o locado fique vago.
Entendemos, contudo, que as partes, aquando da celebração do contrato de arrendamento, podem acordar a possibilidade de o senhorio mostrar o locado, seja a potenciais compradores se já tiver como objetivo a venda do imóvel durante o arrendamento, seja como forma de salvaguardar essa possibilidade, bem como, possa mostrar o imóvel a potenciais novos arrendatários avizinhando-se o fim do contrato de arrendamento em vigor. De resto, não é incomum tal ser acordado nos contratos, definindo-se habitualmente um período temporal, horários específicos e número máximo de visitas mensais, por exemplo.
Nesse sentido, aconselha-se que os potenciais senhorios que pretendam vender o imóvel que, entretanto, e enquanto a venda não se concretiza, é arrendado, que queiram deixar essa possibilidade em aberto, ou que queiram, de forma a rentabilizar o arrendamento, iniciar algumas visitas por potenciais arrendatários antes de terminado o arrendamento em vigor, se aconselhem devidamente e assegurem um contrato de arrendamento que permita isso mesmo, dentro dos limites legais e de uma forma equilibrada.
E como se gerem as visitas a imóveis no atual contexto de pandemia?
Apenas uma nota final para o enquadramento deste tema com a pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2.
Naturalmente que a pandemia veio obrigar a novos comportamentos e constrangimentos, bem conhecidos. Assim, obviamente que aquele direito de o senhorio examinar o imóvel, tal como, possíveis visitas acordadas entre as partes no contrato de arrendamento, têm que respeitar recomendações da Direção Geral de Saúde (DGS) e as imposições decorrentes da legislação em vigor.
Assim, o uso de máscara, o distanciamento, limitação de número de pessoas, desinfeção de mãos, … são medidas necessárias, podendo mesmo algumas situações excecionais impossibilitar o exame da coisa locada pelo senhorio ou visitas, pense-se na hipótese de os arrendatários estarem em isolamento profilático, que, dir-se-á, terão que comprovar perante o senhorio.
Artigo publicado pelo idealista